A insensatez diplomática

Por: Gen. Marco Aurélio Vieira 27 de fevereiro de 2024

“Quando a alma se opõe ao conhecimento, ou opinião, ou razão, que se constituem em suas leis naturais, a isso denomino insensatez.” – Platão

Em seu magistral livro a Marcha da Insensatez, a historiadora americana Barbara Tuchman tratou com singular objetividade o tema do desgoverno, ou seja, “… Por que os homens com poder de decisão política tão frequentemente agem de forma contrária àquela apontada pela razão e que os próprios interesses em jogo sugerem?”.  Segundo ela, o desgoverno apresenta quatro tipos, às vezes combinados: tirania ou opressão, ambição desmedida, incompetência ou decadência, e insensatez ou obstinação. A insensatez é o sintoma de desgoverno mais comum nas democracias modernas, e no Brasil vem atingindo indistintamente não apenas várias das esferas deste governo, como também outras de nossas atuais instituições republicanas.

O mais recente exemplo do desgoverno de Lula é a  crise diplomática fabricada pelo próprio Presidente, quando no último dia 18 de fevereiro, como convidado, em Adis Abeba na Etiópia, para a reunião da cúpula da União Africana, ele comparou os ataques de Israel contra a organização terrorista HAMÁS às ações nazistas contra os judeus: “O que está acontecendo na Faixa Gaza não existe em nenhum outro momento histórico, aliás, existiu… quando Hitler resolveu matar os judeus”, foi o que afirmou o presidente brasileiro, dando início à crise. No mesmo dia, o Primeiro Ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, criticou a fala de Lula classificando-a de “vergonhosa”. No dia seguinte, o Ministro das relações exteriores israelita declarou Lula “persona non grata” em Israele constrangeu publicamente o Embaixador do Brasil – Fred Meyer – ao levá-lo para o museu do Holocausto em Jerusalém, advertindo-o publicamente em hebraico, idioma que o brasileiro não domina. Ato contínuo, ainda em 19 de fevereiro, o Embaixador Fred Meyer foi chamado de volta ao país, enquanto o Ministro das Relações Exteriores do Brasil se reuniu com Embaixador de Israel no Brasil, expressando-lhe o mal-estar provocado pelas atitudes pouco protocolares da diplomacia israelense. Estava instalada uma grave e inédita crise diplomática, causada tão somente pela verborrágica irresponsabilidade de Lula, e a total incompetência do assessoramento desse atual corpo “esquerdodiplomático” brasileiro.

Políticos, artistas, ou personalidades públicas costumam cometer gafes de falta de educação, erros de matemática ou de linguagem, usando termos inadequados ao ambiente ou às situações, mas o alcance dessas besteiras não vai além de fofocas nos meios de comunicação, ou nas páginas dos haters da Internet. E eles costumam pesar prós e contras para suas imagens profissionais, geralmente se desculpando. Entretanto, uma manifestação pública do presidente de um país, em presença da mídia internacional, numa assembleia de nações em outro continente – sem retratação posterior – tem outra relevância e outras conotações, nunca para o bem, sempre para o mal. Não perceber a gravidade dessa atitude é ignorância ou má fé, e não há alternativas.

O nosso Presidente vem incidindo nas quatro causas de desgoverno apontadas por Tuchman, e parece que o faz de maneira pensada, sem qualquer sinal de arrependimento: Lula mostra seu lado “tirania”, quando inventa viagens internacionais dispendiosas e sem objetivos concretos – teoricamente representando (pelo voto) menos de 30% de brasileiros – e adota posturas políticas contrárias aos interesses da nação, impondo ao país seu alinhamento pessoal com regimes de tiranos comunistas e grupos terroristas; ele mostra “ambição desmedida”, quando se lança em canhestra campanha visando o premio Nobel da Paz, sem medir as consequências de suas declarações para a imagem diplomática, ou os interesses comerciais do Brasil, que certamente vai sofrer retaliações das potências ocidentais, que hoje dominam o mercado mundial; o petista demonstra “incompetência” flagrante ao insistir em falar de improviso, mentindo sem qualquer pudor publicamente, citando dados, fatos históricos, nomes – até de árvores frutíferas – muitas  vezes completamente errados ou distorcidos; e Lula mostra principalmente “insensatez”, ao não se retratar com o governo de Israel, e nem tentar contornar a crise por meios diplomáticos, insistindo em seus argumentos hipócritas e pouco convincentes, falsamente obcecado pela “paz mundial”, imagem que o ódio do bem de seus discursos não permite disfarçar.

Na quinta-feira, 22 de fevereiro, os Deputados federais da oposição protocolaram um pedido, com cerca de 140 assinaturas, de impeachment do presidente Lula, argumentando que ele infringiu o Artigo 5° da Constituição Federal, que prevê como crime de responsabilidade: “Cometer ato de hostilidade contra nação estrangeira, expondo a República ao perigo da guerra, ou comprometendo-lhe a neutralidade”. A pesquisadora do Centro Brasileiro de Relações Internacionais Monique Sochaczewski também classificou como antissemita a fala de Lula,  pois: “vai além da crítica válida ao conflito e compara-o ao Holocausto, quando 6 milhões de judeus foram mortos em escala industrial e planejada pelo regime nazista. Trata-se de uma provocação clara ao escolher não qualquer genocídio, mas a Shoah, em que as vítimas foram os judeus”.

Temos elementos sim, para questionar a legitimidade do Presidente na sua busca inconsequente de protagonismo internacional, valendo-se de declarações ideológicas e adotando posições políticas discutíveis, com já constatados prejuízos para a credibilidade e os interesse do Brasil, inclusive para a Segurança Nacional. Observa-se que ao tomar partido nessa guerra religiosa/geopolítica milenar, considerando-se as atuais inúmeras facilidades de se exportar conflitos bélicos híbridos, Lula pode trazer para o Brasil problemas que naturalmente jamais teríamos, e nem estamos preparados para enfrentar.

Terrorismo religioso, imigração muçulmana descontrolada, boicote comercial de empresas israelenses ou de controle acionário judeu, dificuldade do país de impor seus interesses nos organismos internacionais, hostilidade aos brasileiros em situações de dependência de quaisquer dos litigantes desse conflito, são algumas das possíveis consequências da insensata posição diplomática partidária do Presidente – que, ressalte-se, não é da maioria dos brasileiros. E pior, superando ou não a crise, não se vislumbra qualquer vantagem, presente ou futura, para o Brasil ou os brasileiros, muito menos como justificar perante a comunidade internacional a vergonha do agradecimento público do HAMÁS na Internet ao nosso Presidente, pelo seu apoio à causa terrorista.

Lula já é considerado um “anão diplomático” no ambiente dos organismos internacionais, e mesmo junto aos governos do mundo ocidental.  Perigo constatado: a política externa do Brasil está sendo ditada por um notório incompetente, orgulhoso de sua ignorância, e sem qualquer noção de história, geopolítica ou relações internacionais. Vergonha alheia: cegos ideológicos, ou bajuladores de interesses inconfessáveis, os áulicos do seu entorno, assim como a velha mídia enviesada continuam a incensá-lo como o estadista humanitário do século. Futuro indigente: Lula agora se acredita líder do “sul global” – seja lá o que isso representa –  e está empenhado em congregar em torno de velhos mantras comunistas algumas nações amputadas em suas liberdades, como Irã, Cuba, Venezuela e Nicarágua, além de outras tantas também governadas por ditadores, todas incapazes de qualquer retorno para o nosso país. Como não ser pessimista?

Texto: Gen Marco Aurélio Vieira, ex-comandante da Brigada de Operações Especiais e da Brigada de Infantaria Paraquedista.

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