Manifesto

Por: Associação Brasileira de Juristas Conservadores 11 de fevereiro de 2022

A Associação Brasileira de Juristas Conservadores – ABRAJUC, entidade que congrega profissionais de todas as áreas do Direito, unidos em torno dos valores e princípios consagrados na Constituição da República Federativa do Brasil, vem mais uma vez, se manifestar em público, a respeito da inoculação de vacinas em crianças. Em todos os aspectos da vida, e em especial na medicina, os riscos e os benefícios devem sempre ser avaliados para a tomada de determinadas ações. Cuidando-se da utilização de qualquer substância pelas crianças, essa análise deve ser ainda mais criteriosa e imperativa.

Desde o início da pandemia até os dias atuais, cerca de 300 crianças entre 5 a 11 anos já vieram a óbito com resultado positivo de Covid-19. Embora haja relatos de que essas fatalidades se dêem em maior número em pacientes com comorbidades, neste caso específico não há a clara diferenciação entre as crianças que morreram com Covid-19 e aquelas que morreram em decorrência da Covid-19. Em que pese a importância de qualquer vida perdida, esse número representa apenas 0,05% do total de óbitos pela doença. Diversos estudos e a realidade já demonstraram que as crianças têm uma relativa proteção em relação aos adultos e idosos na Covid-19. Infectam-se menos, transmitem menos e apresentam menores taxas de morbi-mortalidade.

No mês de dezembro de 2021, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a vacina Cominarty, da fabricante Pfizer-BioNTech para uso na faixa etária entre 5 a 11 anos. Com base nesta aprovação, inúmeras sociedades médicas e instituições, públicas e
privadas, passaram a exigir a obrigatoriedade da vacinação para o público infantil.

Embora a Anvisa preste um importante trabalho, é reconhecível que houve uma significativa flexibilização em seus próprios critérios estabelecidos para a aprovação destes imunizantes, até compreensível pelo caráter da emergência sanitária. Entretanto, é importante apontar que os estudos destes imunizantes ainda estão em andamento, conforme facilmente demonstrável no próprio site clinicaltrials.com, onde são registrados os ensaios clínicos. Ademais, o principal estudo que o fabricante encaminhou para a aprovação do imunizante contou com um pouco mais de 2000 crianças, as quais foram acompanhadas por um período não superior a 6 meses.

Em sua própria conclusão, o fabricante afirma que com essa amostra não é possível avaliar o desenvolvimento de doenças raras, e que tais crianças ainda seriam acompanhadas por mais 2 anos para avaliar a segurança neste período. Ainda que a curto prazo tenha mostrado eficácia e relativa segurança, tal aprovação da Anvisa não modifica a característica experimental deste imunizante. Embora já se tenha conhecimento de inúmeros efeitos colaterais a curto prazo (miocardite, pericardite, reações anafiláticas e outras), a fase de farmacovigilância está ocorrendo no mundo real, e somente o tempo poderá trazer todas as respostas, em destaque os possíveis efeitos a longo prazo.

Além de todo esse cenário, hoje a pandemia está dominada pela ocorrência da cepa Ômicron, com maior transmissibilidade e menor letalidade, a qual não foi objeto de estudo destes imunizantes. Todos eles são baseados na cepa original.

Em resumo, colocando-se na balança os riscos e os benefícios já existentes, além dos desconhecidos até o momento, não há uma lógica compreensível do ponto de vista médica em se obrigar a vacinação desta faixa etária de maneira massiva. A aprovação do imunizante não é sinônimo de indicação. A imunização deveria ocorrer analisando-se caso a caso, após extensivo esclarecimento e consentimento dos genitores acerca de todos estes fatos. Diante destes argumentos, a obrigatoriedade parece primeiramente atender outros objetivos que não médicos. No âmbito jurídico, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece no artigo 14, § 1º que “é obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias”.

O referido estatuto também estipula que “a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida nesta lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares” (art. 100, par. único, inciso II, ECA). A interpretação que a tradição do Direito confere ao artigo 14, § 1º do ECA, por intermédio de conceituadas doutrinas e julgados dos tribunais, caminha no sentido de que a única autoridade sanitária que possui legitimidade para definir quais vacinas serão obrigatórias é o Ministério da Saúde, e que a recomendação de obrigatoriedade somente ocorre por intermédio da inclusão da vacina aprovada no Plano Nacional de Imunização -PNI.

Entidades públicas e segmentos da sociedade civil que buscam conferir interpretação diversa estão notoriamente desrespeitando a disposição expressa contida no artigo 3º da Lei Federal nº 6.259/75, o qual prescreve que “cabe ao Ministério da Saúde a elaboração do Programa Nacional de Imunizações, que definirá as vacinações, inclusive as de caráter obrigatório”.

A esse respeito, o Ministério da Saúde reiteradamente manifesta, nas vias oficiais, que a vacinação contra a Covid-19 para crianças será facultativa, necessariamente dependendo da concordância dos pais. Portanto, a vacinação de crianças não é obrigatória, e devaneios em torno da aplicação automática do art. 14, § 1º do ECA por outras hipóteses não previstas na lei estão em manifesto desacordo com o ordenamento jurídico nacional. O momento exige a restauração da estabilidade jurídica do país, iniciando-se pelo respeito aos precedentes oriundos da interpretação do Direito, que foram honradamente edificados por renomados juristas no curso dos anos pretéritos.

Assim, no contexto de uma pandemia global, em que o princípio da proteção integral assume relevância ímpar na história do Brasil, a ABRAJUC repudia quaisquer interpretações que, rompendo com a tradição jurídica, visem desconstituir os consolidados precedentes em torno da aplicação regra vigente, com o propósito estabelecer a obrigatoriedade de vacinação do público infantil com utilização de produtos experimentais, aliado a outros objetivos insondáveis, ocasionando severo risco de comprometimento da saúde das crianças brasileiras.

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