As forças desarmadas

Por: Gen. Ex. Maynard Marques de Santa Rosa 17 de maio de 2022

A ironia do alto magistrado é sintomática da falta de isenção jurídica e manifesto desapreço pela instituição mais consistente do Estado nacional.

Já há algum tempo, certas autoridades parecem desnorteadas de senso crítico e mesmo de respeito aos referenciais de conduta necessários à dignidade da função.

Foi uma decisão proferida pelo mesmo ministro, durante a pandemia, que sentenciou à morte a Operação Lava-Jato, última esperança de justiça do povo. A sociedade, passiva, passou novamente a suportar o cinismo da impunidade.

Invalidar o efeito de fatos comprovados alegando suspeição não comprovada, é flagrante violação da lógica aristotélica. O poder de invalidar fatos é atributo inerente à Divindade. Ignorar crimes hediondos de corrupção mostra uma insensibilidade abjeta. Se o aparato admite que uma falha processual transcenda o mérito do ilícito, abdicada sua função social e merece ser substituído.

No Brasil, a articulação de grupos de interesse em torno de agendas políticas age como confirmação da tese de “Os donos do poder”, de Raymundo Faoro. “O estamento político”, diz ele,“constitui uma comunidade amorfa: seus membros pensam e agem conscientes de pertencer a um mesmo grupo, a um círculo elevado”. “No estamento, o vazio é rapidamente preenchido, por meio de chefes e líderes de que ninguém conhece o nome. É um processo de muitos artifícios e falsidade, onde não entra o povo e a soberania popular funciona às avessas”. “O pensamento político esta mental será de caráter abstrato, voltado para as doutrinas universais, sufocado no idealismo das fórmulas”(pág. 61, 111 e 112).

No contexto nacional, a Corte Suprema vem se mostrando permeável às petições dos pequenos partidos de oposição, o que lhes permite desbordar o processo legislativo, para ingerir em decisões dos demais poderes. Talvez seja um arranjo das forças desarmadas.

A militância estamental já se manifesta sem reservas no exterior, como mostrou a imprensa, em fevereiro, quando um ministro do STF,na Universidade do Texas, fez comentários sobre o tema “Ditching a President” em um foro estudantil; e em abril, na Universidade de Harvard, quando outro declarou: “Nós somos muito poderosos, nós somos a democracia, nós somos os poderes do bem”,durante encontro congregando empresários, políticos, artistas e magistrados.

Quando, em pleno ano eleitoral, a soberania popularse depara com ameaças de usurpação, as forças vivas da nação, armadas ou não, precisam despertar, em legítima defesa da ordem constitucional. Afinal, “cada macaco, no seu galho”.

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